sexta-feira, 23 de abril de 2010

O que fazer na estação das chuvas

O que fazer na estação das chuvas

Ricardo Kubrusly



A volta pra casa na no 5 de abril, para os que, ao final do dia, interrompiam, ou pelo menos, transportavam para casa, suas tarefas, meditações e/ou cálculos, apresentou-se lenta, amedrontada, imprevisível. Talvez até não totalmente imprevisível, se se imagina e aplica todo o vastíssimo conhecimento que hoje já se detém dos vários comportamentos das equações meteorológicas. Mas mesmo que as quantidades com suas magnitudes pudessem ser previstas, o susto ao ver a cidade ferida tão profundamente era, e ainda é, por nós desconhecido. Poucos de nós, se tanto, imaginaram no decorrer da noite do temporal, que ficaríamos inativos e inoperantes, por uma semana ou quase.


Este ano parece vindo de uma ficção absurda, um ano que não se desenrola. Parece que estamos com dificuldades de iniciá-lo, como se deprimidos e/ou eufóricos esperássemos, atônitos, da morte à vitória, um grande acontecimento. Algo assim como um perdão inicial, um sopro ou vento que nos impulsionasse além e agora. Mas nada aconteceu senão o grande temporal. Será, então, ele, o marco inicial que precisávamos para travar conosco mesmo uma batalha difícil e necessária: Olhar nossa UFRJ estagnada e imaginá-la indo, e com ela, não como a cavalgá-la, mas dançando seus ritmos diversos, guiando guiados gui-indo... como se ela enfim buscasse o seu destino reflexivo?


Aqui entre os cadáveres do Rio, olhando as trapagens político auto-promocionais dos dirigentes que, aqui e por todo lugar onde são vistos, reinam entre holofotes e o retrógrado das ideias mais autoritárias, pergunto: por que vereda de ideia, mais remota, se esgueira o pensamento universitário da UFRJ? Estaremos tão mergulhados na lama empresarial que nos explora para não sermos capazes de reflexões mais profundas, ousadas, inquietantes do que a de comprar um 4x4 para vencer as ruas da cidade, enquanto não removemos de vez o pobre e o operário para alem das nossas vistas? Existiremos para além dos nossos laboratórios desengonçadamente inoperantes? Esta Universidade que está aí, braços causados sobre a cidade agonizante, não pode ser a que sonhamos. Uma universidade que pensa e que pensa o seu próprio pensamento, não pode vir do quadro depressivo que hoje presenciamos em nossos Campi.


É claro que não a estamos pensando direito. É claro que fazemos pouco, é triste que, premidos por relatórios e portais idiossincráticos, pensemos tão pouco. Ensino, pesquisa, extensão não se resumem ao qq nome serve para um projeto que levante uma graninha. Já se foi o tempo que nos orgulhávamos de nossos alunos, são os nossos note-books que se nos vestem, construindo a bella figura do Professor Universitário. Como uma máquina vistosa e inoperante vagamos a reboque e ao largo dos pensamentos que movem o mundo. Por que existir de uma maneira que se nega a olhar o contorno de nossas vidas para buscar incertos universais que nunca em nós se concretizam? É possível sim, pensar uma universidade que pense, é possível pensá-la agora, no hiato dos acontecimentos e pelas frestas do tempo e construí-la ainda, nesse tempo presente.


Se percebermos que o outro lado de nós ainda a nós pertence, se recordarmos a faísca que nos moveu, no seus primeiro impulso, para a conquista intelectual que então buscávamos, o quanto de poder revolucionário que tinham nossos pensamentos, claro que nos sentiremos frustrados com o que conseguimos, mas, a frustração, que não deve nem pode ser tapada pelo vazio de homens e ideias de nossas novas parafernálias, será, junto ao espírito que então relembraremos, valorosos guias na construção do que buscamos para a UFRJ. Viver o tudo sempre agora é o nosso plano. Vamos a ele.

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