terça-feira, 1 de março de 2011

Triste UFRJ

Monólogo para Três Cabeças Pensantes- Parte I

ou

Triste UFRJ

  1. A UFRJ anda tão pobre de idéias que este processo de “eleição” de reitor está copiando a recente e triste eleição presidencial: diferentes nomes, o mesmo programa de governo, promessas eleitoreiras vagas. Tudo num vazio proposital sobre os rumos do país. Mais uma cópia política grotesca.

  1. O silêncio. Acho que descobri por que estou ficando surdo. Há um silêncio ensurdecedor na UFRJ. Como não ouço mais nada (fora meus amigos de luta), minha capacidade de ouvir está sumindo, sumindo... Será que só nós vemos e ouvimos que esta Universidade está mergulhada em conflitos ? Que seu caráter “público” já acabou há muito tempo? Ou será que o silencio é proposital para encobrir os interesses dominantes, os privilégios crescentes?

  1. A geografia. Em pleno século XXI a UFRJ não consegue disfarçar suas contradições. Crescem novos prédios, numa nova “Dubai” universitária. E vem abaixo, depois de meio século de descaso, o prédio do HU. E tudo parece “natural”. Que universidade é esta em que seu campus é ocupado por empresas e doado às mesmas ? De quem ou de que é a responsabilidade pelo abandono de um prédio imenso que poderia, há décadas, estar pleno de atividades científicas e culturais? O silêncio é inaceitável.

  1. A pesquisa e o ensino. Ninguém, nem mesmo o nosso sindicato, parece se importar com o fato de que um número significativo, talvez a grande maioria (certamente não são todos), dos professores da UFRJ abandonam ou relegam a um segundo plano suas atividades em sala de aula. Dar aula não dá dinheiro, portanto, correm para uma pesquisa que tem retorno financeiro, para os convênios, para os negócios. Nosso ensino, principalmente o de graduação, está em crise. Que o digam os estudantes.

  1. O “crescimento” da UFRJ. Sempre apoiamos a expansão de vagas e cursos nas universidades públicas. Mas não seu aumento desordenado, sem preocupação com os rumos do ensino público superior. O resultado ? Está aí o Reuni, cheio de novos cursos, com problemas seríssimos, com poucos professores. Apoiado pela administração atual, pelo CONSUNI. , pelos “manifestos” da Praia Vermelha, no mínimo deveria ser objeto de uma avaliação sobre seu funcionamento atual. Duvido que nesta campanha eleitoral de “abobrinhas” isto seja levantado.

  1. A subordinação da UFRJ ao governo federal. Em tempos recentes foram inúmeros os exemplos de apoio da UFRJ aos projetos do governo Lula. Poucas as críticas. Quase nulas as avaliações sobre isto. Como será daqui para a frente?

7. A grande questão. A universidade pública num país capitalista. Enquanto o capital canibaliza o planeta, nossas cabeças “pensantes” viraram avestruzes. Será que a universidade não tem mais nada a dizer e a fazer? De quem foi a decisão de formarmos jovens “empreendedores”? De nos limitarmos aos interesses do mercado?

Prof. Jose Antônio Marins Simões

IF/UFRJ

A UFRJ pelas bandas do mar


Monólogo para Três Cabeças Pensantes- Parte II

ou

A UFRJ pelas bandas do mar


Aqui a ilha se amarela e o mar ao lado, acanhado, se esconde atrás do moderno edifício. O monstrengo da Petrobras se impõe sobre nossos sonhos e nossas pesquisas e nem mais nos incomodamos, afinal, a ponte nos livrará dos engarrafamentos e o carnaval e a chuva que não vem e o ano que pacientemente espere meados de março, quando atônitos e robotizados, enfrentaremos nossas tarefas e contaremos os feriados e notaremos que nossos alunos são mais e piores e que nossas instalações são as mesmas e não dão conta das nossas necessidades e cruzaremos todos os dias do palácio do petróleo e passaremos todos os dias pelos escombros do Hospital bombardeado por nossa omissão e descaso. Lamentaremos mas sem emoção, acabaremos por concordar que não há mesmo muito a fazer. As decisões, afinal não passam por nossas salas de aula nem por nossos laboratórios nem por nossas conversas e muito menos por nossos técnicos e alunos que não foram ouvidos nem sobre a edificação do monstrengo nem sobre a destruição intempestiva do hospital abandonado.

Aqui a ilha se amarela, o calor transborda de azul o cinza que se insiste cinza em nossos desassossegos. A UFRJ vendida aos editais se esquece de pensar o mundo. Das chuvas de Janeiro, estamos cuidando, os bandidos, Credo Cruz, evaporaram-se graças à eficiência de nossos policias, no Alemão só se fala inglês e pobre de Vito Manuel que não sabe inglês; do deserto de ideias que se inaugura em mais esse ano de faz de conta, não, ninguém se importa, ninguém percebe.

Aqui a ilha se amarela, o mar se foi por trás dos sonhos adiados, já não mais nos damos conta de sua presença, já nos esquecemos do sabor das aventuras e do alcance dos sonhos. Impedidos do mar, já não mais pensamos o Rio. Cobertos de medo, assistimos, silenciosamente, o naufrágio da UFRJ.


Sim, teremos eleições para reitor e os corredores buchicham e nos gabinetes, os telefones não param, mas imitando o país, com suas eleições silenciosamente eletrônicas, com suas repetições do mesmo, seguimos, mais outra vez, a triste lógica do “eu quero mesmo é me dar bem” e as chapas que se apresentam, representam mais o monstrengo que nos divide, o hospital que se desfez do que os alunos técnicos e professores que aqui trabalham com uma réstia de sonho e justiça em suas mãos.

Escondidas em silêncios e vergonhas as questões que uma universidade pública deveria levantar e refletir e debater e por fim, agir e deliberar, ainda se agitam. Há que escutá-las entre os escombros e espelhos desta ilha adormecida. Por onde andarão nossas ideias de ensino-pesquisa-extensão unificados e investigativos? Perdidas e desfeitas por pesquisas financiadas por interesses restritos ao mercado financeiro. Ensino desacreditado, envergonhado e extensão pífia. Aqui, professores são punidos se seus interesses se desviam dos das linhas previamente aquinhoadas por nossas agencias financiadoras. Aqui, professores são condenados a salas de aula. O ensino se tornou envergonhante, a extensão, pífia. Vive-se o faz de conta do progresso inevitável. Sem tempo para refletir copiamos o que se nos é imposto sem sequer conversarmos entre nós mesmos sobre o que estamos fazendo. Vivemos encastelados em nossos laboratórios sem saber o que estamos medindo e para quê? Vivemos preenchendo formulários e pedindo financiamentos e vendendo nossa capacidade produtiva a qualquer oferta de qualquer dinheiro. Há muito não mais nos preocupamos com nossas condições de trabalho. A UFRJ se terceiriza às grandes multinacionais e não existimos como universidade. As perguntas soterradas sob os escombros do que já não somos lentamente desaparecem. E o que sobra somos nós, esperando, silenciosamente, contando os feriados e esperando, esperando, enquanto o calor acontece. Não seria a hora, essa sempre agora, de pensarmos o que fazer com isso, antes de repetirmos os mesmos erros de sempre, antes de nos contentarmos, silenciosamente, mais uma vez, apenas com as mudanças dos nomes dos mesmos?

Prof. Ricardo Kubrusly

IM/HCTE/UFRJ

Escovar a Universidade no Contrapelo da História

Monólogo para Três Cabeças Pensantes- Parte III
ou
Escovar a Universidade no Contrapelo da História


Exigência fundamental de Walter Benjamin é escrever a história a contrapelo, contra a tradição conformista cujos partidários estão, sempre ,"em empatia com o vencedor".


Preparava-me para abrir este manifesto no estilo-chamamento “Vote Nulo na eleição para Reitor ou Construa uma chapa que não represente o continuísmo”, quando, nesta tórrida manhã de sábado ao ligar o ventilador caiu literalmente da minha prateleira uma mensagem de Zeus na forma de um pergaminho velho, de escritor desconhecido.

Título: Sobre meninos e vacas, mais um desastre literário em um monólogo para três cabeças.

Explicava o preâmbulo: “Trata-se de uma carta anônima, sem destinatário, ...escrita numa língua nativa estranha para professores da UFRJ.” Dela eu registro a última parte.


O Hoje que te escrevo é sempre um amanhã desconhecido.

E logo depois:

Quando a morte, vestida de mãe e em onça disfarçada, reconhecendo sua derrota para o amor, despede-se do velho professor apaixonado, ele interrompe sua retirada e a chama: ‘Não vais agora. Ela há de me fazer sofrer e tu me consolas. Mão de mãe não fere, a dor não deixa marcas’.

As escavações continuam... Parece que há sempre algo que escapa à solvência unânime do lodo”.

Assim inspirada, não vejo o momento para meu chamamento panfletário, mas sim para um chamamento contra a solvência unânime no lodo”.

Lodo que pouco a pouco engole a UFRJ, transformando a educação numa instrumentalização massiva, exigência para o necessário ganho de competitividade na lógica do capital. Lodo onde a UFRJ afunda procurando saídas dentro da estreita ótica do modelo capitalista de sociedade.

E assim brotam as “inovadoras” soluções para criação de uma nova sociedade " auto-sustentável , pautada no desenvolvimento tecnológico e na gestão do conhecimento”. Empreendedorismo, a milagrosa fórmula para cura de todos os males é pauta das infindáveis reuniões que traçam “metas “e “ missões ” de todos os nossos mandatários de plantão. Solução primária, falsa e inconsistente, que nos afunda no pantanoso e inexorável caminho traçado pela ótica do capitalismo selvagem e belicista.

Sabemos, especialmente se adotarmos o rigor do método de análise concreta da História, que as inovações tecnológicas são o caminho para a necessária mudança para uma nova sociedade, ao mesmo tempo em que constitui exigência de sobrevida do capital. Solução, tão velha quanto o capitalismo, que traz em si a contradição do próprio modo de produção capitalista.

A nova e estarrecedora conjuntura, tão cruel como as já vividas em outros ciclos de crise mostra – outra vez – que o capitalismo segue o inexorável curso previsto por Marx: diminuição tendencial das taxas de lucro, queda de salário e miserabilização progressiva população mundial. Em Marx também, está explicitada a necessidade permamente da inovação tecnológica como condição de sobrevida do capital, com a incorporação ao processo produtivo de máquinas e inovações tecnológicas para aumento da “competitividade”.

Mudanças que trazem como conseqüência direta a diminuição da taxa de mais-valia e não colocam outra alternativa para sobrevivência do capital que não seja a expansão de mercados e o aumento da exploração da força de trabalho, do trabalhador.

Desnecessário enumerar os exemplos de miséria no planeta, quer nos entornos do Vale do Silício, templo maior da sacralização da tecnologia, e no trágico cotidiano dos da Índia, celeiro de tantas e competitivas inovações tecnológicas .

Soluções verdadeiras devem seguir o caminho apontado por D. Harvey: “É preciso resgatar o capitalismo dos capitalistas.” Desmascarar sua fraudulenta ideologia neoliberal e todas as suas tensões e contradições internas, já insustentáveis, para que, como disse Marx, “o capitalismo desapareça e se abra caminho para algum modo de produzir alternativo e mais racional.”

Assim refletindo, fico a nos perguntar:

#Que UFRJ queremos?

# Minerva, até quando, te curvarás submissa e respeitosa à lógica do capital?

# Reitoria, até quando defenderás o Reuni, as expansões sem estrutura e atrasarás as bolsas de estudantes alojados numa precária e vergonhosa construção?

# Reitoria, até quando permitirás a privatização dos estacionamentos do CT, a exploração dos guardadores e terceirizados?

# Mais ainda, há diferenças entre as chapas concorrentes?

E assim pensando respondo:

Vote Nulo ou Construa uma Chapa que reinvente nossa história na contra hegemonia do capital.

Profa. Vera Salim PEQ/COPPE/UFRJ